03/08/2015

Como ser mais feliz? A importância do contentamento, aceitação e serenidade

Rita B. Domingues & Márcio C. Santos

Intimamente relacionadas com a gratidão e a compaixão estão outras duas emoções similares, o contentamento e a aceitação, que se traduzem pelo aceitamento e satisfação com determinada situação, quer por a situação ir ao encontro das expectativas (Deci & Ryan, 2000), como também por as expectativas acomodarem a situação (Tong, 2015). O contentamento é uma emoção agradável que provoca uma perceção de controlo e responsabilidade pessoal sobre as situações (Rothermund & Brandstädter, 2003). A gratidão e o contentamento opõem-se ao materialismo, contribuindo para uma diminuição da vontade de consumo desenfreado (Polak & McCullough, 2006). O materialismo está profundamente enraizado na cultura ocidental devido à crença de que bens e riqueza trazem felicidade; no entanto, os efeitos são precisamente os contrários, estando o materialismo associado de forma negativa a praticamente todas as variáveis de qualidade de vida que têm sido estudadas (Polak & McCullough, 2006 e referências associadas). Tanto a gratidão pelo que se tem, como o contentamento com o que se tem ajudam a diminuir a mentalidade materialista e consumista dos indivíduos, aumentando, assim, o bem-estar emocional. O desenvolvimento destas emoções contribui, portanto, para uma maior felicidade.

Por fim, a serenidade é uma outra emoção frequentemente referida na literatura não-científica. A serenidade é um estado em que o indivíduo se sente calmo, tranquilo, em paz; a serenidade está associada a perceções de ausência de obstáculos e confiança no presente e no futuro (Ellsworth & Smith, 1988). Do ponto de vista empírico, a serenidade é uma emoção ainda muito pouco estudada (Fredrickson, 2002), possivelmente devido ao seu carácter multifacetado e integrador, e ao seu significado cultural. De facto, a serenidade não é referida como uma das emoções básicas por Ekman (1992), mas é referida como emoção básica em textos hindus e budistas (Shweder, Haidt, Horton, & Joseph, 2008). Por exemplo, de acordo com as escrituras budistas, a serenidade é necessária para atingir o estado de Nirvana, que é um estado emocional – ou melhor, um estado de ausência de emoções – que se caracteriza pela libertação do sofrimento. Daí que a busca da serenidade esteja tão presente no artigo em análise e noutros textos da imprensa não científica, como meio de atingir a felicidade. A descoberta das filosofias orientais tem aproximado as várias culturas e tem-se observado nas últimas décadas uma expansão das práticas orientais no Ocidente – resultando, claro, em maiores níveis de felicidade (e.g., Lomas, Cartwright, Edginton, & Ridge, 2014).



Referências

Deci, E. L., & Ryan, R. M. (2000). The “ What ” and “ Why ” of goal pursuits: human needs and the self-determination of behavior. Psychological Inquiry, 11(4), 227–268. doi:10.1207/S15327965PLI1104
Ekman, P. (1992). An argument for basic emotions. Cognition & Emotion, 6(3), 169–200. doi:10.1080/02699939208411068
Ellsworth, P. C., & Smith, C. A. (1988). Shades of joy: patterns of appraisal differentiating pleasant emotions. Cognition & Emotion, 2(4), 301–331. doi:10.1080/02699938808412702
Fredrickson, B. (2002). The future of positive psychology. In C. R. Snyder & S. J. Lopez (Eds.), Handbook of Positive Psychology. Oxford University Press.
Lomas, T., Cartwright, T., Edginton, T., & Ridge, D. (2014). A religion of wellbeing? The appeal of buddhism to men in London, United Kingdom. Psychology of Religion and Spirituality, 6(3), 198–207. doi:10.1037/a0036420
Polak, E. L., & McCullough, M. E. (2006). Is gratitude an alternative to materialism? Journal of Happiness Studies, 7(3), 343–360. doi:10.1007/s10902-005-3649-5
Rothermund, K., & Brandstädter, J. (2003). Coping with deficits and losses in later life: from compensatory action to accommodation. Psychology and Aging, 18(4), 896–905. Retrieved from http://psycnet.apa.org/?&fa=main.doiLanding&doi=10.1037/0882-7974.18.4.896
Shweder, R. A., Haidt, J., Horton, R., & Joseph, C. (2008). The cultural psychology of the emotions: ancient and renewed. In M. Lewis, J. Haviland-Jones, & L. F. Barrett (Eds.), Handbook of Emotions. The Guilford Press.
Tong, E. M. W. (2015). Differentiation of 13 positive emotions by appraisals. Cognition & Emotion, 29(3), 484–503. doi:10.1080/02699931.2014.922056


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3 comentários:

  1. Gostei muito deste artigo!

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  2. Olá Rita, acompanho seu blog há 1 ano e desde então você tem me inspirado bastante com a prática da yoga e da meditação. Sou bióloga e estou a adorar esta série de textos onde você analisa tais práticas com a visão esclarecedora da ciência. Mal posso esperar pelos próximos textos.
    Abraços :)

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